Eros et Agape
Bento XVI publicou sua primeira encíclica (carta de âmbito universal que o Papa envia a todas as igrejas em comunhão com Roma) no dia 25 de Janeiro. Chama-se Deus caritas est (Deus é amor) e organiza-se em duas partes: na primeira, mais teórica, Bento unifica os conceitos de Eros (amor entre homem e mulher) e Agape (a caridade, o amor que se doa ao outro); na segunda, o Papa centra-se na acção caritativa da igreja, que mais do que uma forma de “assistência social”, deve ser uma parte essencial da sua natureza.
Abrindo o pontificado de Bento XVI está pois a ideia de que “num mundo em que ao nome de Deus se associa, às vezes, a vingança ou mesmo o dever do ódio e da violência”, falar de Deus como amor “é uma mensagem de grande actualidade e de significado muito concreto”. Até aqui, tudo bem, haja liberdade de culto e tal e tal e tal.
Confesso que saber que um Papa da igreja romana andava a falar de Eros me despertou a curiosidade e, como só começo o italiano no Outono e latim é só com recurso ao meu dicionário-humano (obrigada, S.!, bendita FD UC), fui à procura da tradução da dita Deus caritas est. Para Bento XVI o amor está banalizado, é usado por tudo e por nada, é mais uma caricatura (má escolha de palavras) do que verdadeiro amor. Por isso, defende na encíclica que é preciso regressar “ao amor com que Deus nos cumula e que deve ser comunicado aos outros”.
Ou seja. Falando de católicos, a ideia é a de que Eros, passando por um caminho de “purificação”, desemboca na Agape, no amor que renuncia a si mesmo, em favor do outro. Neste contexto, a relação entre homem e mulher é o “arquétipo” do amor, sendo que o ser humano passa “do amor indeterminado e ainda em fase de procura” para “a descoberta do outro” e que, dessa evolução do amor, faz parte que ele procure um “carácter definitivo”: “no sentido da exclusividade e no sentido de ser para sempre”.
A segunda parte da encíclipa, por mim, é pacífica. Basicamente (muito basicamente) afirma e defende que “Toda a actividade da igreja é manifestação dum amor que procura o bem integral do homem”. Admirável e meritório, eu tenho o mesmíssimo objectivo, mas uso ferramentas diferentes. Acho óptimo. :)
O que me despertou a atenção foi a suave e académica inversão de marcha que a primeira directiva comunitária ;) do novo Papa vem confirmar. Bento XVI é um reconhecido nazi ecuménico, responsável pelas sustentações teórico-teológicas do Vaticano nos últimos 20 anos. Quando foi eleito (ou o que quer que seja que aquilo é), muito se escreveu acerca da probabilidade de a igreja católica estar a recuar no tempo, elegendo um conservador para suceder ao reformador João Paulo. Entretanto, a modorra instala-se e a igreja de Roma mantém-se discreta - inclusivamente durante toda a celeuma das caricaturas nórdicas: curioso, não??
Na primeira vez que se pronuncia de forma estruturada, Bento XVI prova a sua superior inteligência como gestor da fé e da política católicas - apela ao reavivar do sacramento do matrimónio, incita à monogamia e mostra-se detrator do divórcio. Não posso criticar nenhuma das posições: não seria o Mundo Mundo se Roma não defendesse estes três paradigmas. O que me revolta as entranhas é a táctica cobarde de contornar as questões e não dar o corpinho ao manifesto. Contracepção? Esqueçam. Concubinagem? Nem pensem nisso. Erros de escolha? Não se admitem.
Aliás, apenas umas duas semanas depois da publicação da Deus caritas est, um bispo brasileiro veio a público condenar as autoridades sanitárias por distribuírem preservativos à população nos dias que antecederam o Carnaval. Ora, todos nós sabemos que celibato e Carnaval-no-Brasil são dois conceitos compatibilíssimos. Pior. O dito padre afirmou a um jornal local que, embora as pessoas achem radical a posição da igreja, esta não se trata de uma imposição, mas sim de uma decisão pessoal. Ó meus amigos! Haja coerência! Em que é que ficamos??
Bento, amigo... A malta tem sexo. (Ia dizer que a malta fode, mas pareceu-me um bocado bruto para o contexto.) A promiscuidade é boa? Não. A ausência de amor na relação carnal é o ideal? Não. Mas é o mundo que temos e no qual vivemos. Não se apoie, mas aceite-se. Cresçam para lá das paredes da Cidade de Pedro e comecem a prática da caridade pela defesa e protecção dos vossos fiéis: ensinem-nos a ser monogâmicos, mas usem essa magnífica capacidade católica de absolver os pecados para lhes permitir que vivam no mundo real. A ver se começa a haver mais católicos "praticantes"...
Abrindo o pontificado de Bento XVI está pois a ideia de que “num mundo em que ao nome de Deus se associa, às vezes, a vingança ou mesmo o dever do ódio e da violência”, falar de Deus como amor “é uma mensagem de grande actualidade e de significado muito concreto”. Até aqui, tudo bem, haja liberdade de culto e tal e tal e tal.
Confesso que saber que um Papa da igreja romana andava a falar de Eros me despertou a curiosidade e, como só começo o italiano no Outono e latim é só com recurso ao meu dicionário-humano (obrigada, S.!, bendita FD UC), fui à procura da tradução da dita Deus caritas est. Para Bento XVI o amor está banalizado, é usado por tudo e por nada, é mais uma caricatura (má escolha de palavras) do que verdadeiro amor. Por isso, defende na encíclica que é preciso regressar “ao amor com que Deus nos cumula e que deve ser comunicado aos outros”.
Ou seja. Falando de católicos, a ideia é a de que Eros, passando por um caminho de “purificação”, desemboca na Agape, no amor que renuncia a si mesmo, em favor do outro. Neste contexto, a relação entre homem e mulher é o “arquétipo” do amor, sendo que o ser humano passa “do amor indeterminado e ainda em fase de procura” para “a descoberta do outro” e que, dessa evolução do amor, faz parte que ele procure um “carácter definitivo”: “no sentido da exclusividade e no sentido de ser para sempre”.
A segunda parte da encíclipa, por mim, é pacífica. Basicamente (muito basicamente) afirma e defende que “Toda a actividade da igreja é manifestação dum amor que procura o bem integral do homem”. Admirável e meritório, eu tenho o mesmíssimo objectivo, mas uso ferramentas diferentes. Acho óptimo. :)
O que me despertou a atenção foi a suave e académica inversão de marcha que a primeira directiva comunitária ;) do novo Papa vem confirmar. Bento XVI é um reconhecido nazi ecuménico, responsável pelas sustentações teórico-teológicas do Vaticano nos últimos 20 anos. Quando foi eleito (ou o que quer que seja que aquilo é), muito se escreveu acerca da probabilidade de a igreja católica estar a recuar no tempo, elegendo um conservador para suceder ao reformador João Paulo. Entretanto, a modorra instala-se e a igreja de Roma mantém-se discreta - inclusivamente durante toda a celeuma das caricaturas nórdicas: curioso, não??
Na primeira vez que se pronuncia de forma estruturada, Bento XVI prova a sua superior inteligência como gestor da fé e da política católicas - apela ao reavivar do sacramento do matrimónio, incita à monogamia e mostra-se detrator do divórcio. Não posso criticar nenhuma das posições: não seria o Mundo Mundo se Roma não defendesse estes três paradigmas. O que me revolta as entranhas é a táctica cobarde de contornar as questões e não dar o corpinho ao manifesto. Contracepção? Esqueçam. Concubinagem? Nem pensem nisso. Erros de escolha? Não se admitem.
Aliás, apenas umas duas semanas depois da publicação da Deus caritas est, um bispo brasileiro veio a público condenar as autoridades sanitárias por distribuírem preservativos à população nos dias que antecederam o Carnaval. Ora, todos nós sabemos que celibato e Carnaval-no-Brasil são dois conceitos compatibilíssimos. Pior. O dito padre afirmou a um jornal local que, embora as pessoas achem radical a posição da igreja, esta não se trata de uma imposição, mas sim de uma decisão pessoal. Ó meus amigos! Haja coerência! Em que é que ficamos??
Bento, amigo... A malta tem sexo. (Ia dizer que a malta fode, mas pareceu-me um bocado bruto para o contexto.) A promiscuidade é boa? Não. A ausência de amor na relação carnal é o ideal? Não. Mas é o mundo que temos e no qual vivemos. Não se apoie, mas aceite-se. Cresçam para lá das paredes da Cidade de Pedro e comecem a prática da caridade pela defesa e protecção dos vossos fiéis: ensinem-nos a ser monogâmicos, mas usem essa magnífica capacidade católica de absolver os pecados para lhes permitir que vivam no mundo real. A ver se começa a haver mais católicos "praticantes"...
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