Alma negra
Quero contar-vos uma estória que nunca chegou a ter história. Um conto que me contaram em tempos idos, a uma lareira de aldeia. Uma estória que o tempo esbateu mas que me voltou a cruzar a vida ainda no outro dia.
Era um conto de um homem com uma alma negra. De um homem que se dizia abandonado pela sorte e pelo amor, ferido de morte no mais fundo do seu âmago, que calcorreava a vida carregando uma suposta solidão e tentando perder-se onde se sabia achado. Um corpo indeciso que recuava fingindo avançar, sob a capa da impossibilidade de dar e transcender.
Um homem que afirmava a honestidade das suas meias verdades. Que pedia demasiadas desculpas. Que nunca assumia um passo fora do seu caminho, não pelo dogmatismo das suas posições, mas por mera incapacidade de se ver para além da sua miserabilidade.
Uma alma negra que procurava insaciantemente, vorazmente, desesperadamente provocar nos que de alguma forma lhe cruzavam a cama ou a mesa todas as manifestações de luz que pudesse causar e que se comprazia em contemplar, apenas para, logo logo depois, rechaçar qualquer dádiva que lhe fosse ofertada.
Um medo terrível de viver, de desfrutar e de amar reflectido nuns olhos duros que nunca mostravam o que pensavam. Opacos. Voltados para dentro. Incapazes de admirar o concreto porque os reflexos eram sempre mais pálidos, mais suave, mais fáceis.
Um homem que afirmava optar pelo mais duro, ofertar sofrimento em prol do conforto alheio, recuar para deixar espaço à manifestação do outro. Mas que nunca conseguiu perceber que se limitava a recolher às sombras porque o negro da alma não lhe permitia seguir em frente.
Um homem que dizia acelerar em direcção ao futuro sem perceber que a paisagem mudava apenas porque tinha, de novo, voltado a inverter a marcha.
Sabiam que esse homem morreu? Disseram-me no outro dia que esse homem morreu. Mas quem mo contou não me soube dizer se o homem da alma negra morreu porque se lhe secou a vida ou se foi porque abriu os olhos e lhe entrou o sol pela alma adentro.
Era um conto de um homem com uma alma negra. De um homem que se dizia abandonado pela sorte e pelo amor, ferido de morte no mais fundo do seu âmago, que calcorreava a vida carregando uma suposta solidão e tentando perder-se onde se sabia achado. Um corpo indeciso que recuava fingindo avançar, sob a capa da impossibilidade de dar e transcender.
Um homem que afirmava a honestidade das suas meias verdades. Que pedia demasiadas desculpas. Que nunca assumia um passo fora do seu caminho, não pelo dogmatismo das suas posições, mas por mera incapacidade de se ver para além da sua miserabilidade.
Uma alma negra que procurava insaciantemente, vorazmente, desesperadamente provocar nos que de alguma forma lhe cruzavam a cama ou a mesa todas as manifestações de luz que pudesse causar e que se comprazia em contemplar, apenas para, logo logo depois, rechaçar qualquer dádiva que lhe fosse ofertada.
Um medo terrível de viver, de desfrutar e de amar reflectido nuns olhos duros que nunca mostravam o que pensavam. Opacos. Voltados para dentro. Incapazes de admirar o concreto porque os reflexos eram sempre mais pálidos, mais suave, mais fáceis.
Um homem que afirmava optar pelo mais duro, ofertar sofrimento em prol do conforto alheio, recuar para deixar espaço à manifestação do outro. Mas que nunca conseguiu perceber que se limitava a recolher às sombras porque o negro da alma não lhe permitia seguir em frente.
Um homem que dizia acelerar em direcção ao futuro sem perceber que a paisagem mudava apenas porque tinha, de novo, voltado a inverter a marcha.
Sabiam que esse homem morreu? Disseram-me no outro dia que esse homem morreu. Mas quem mo contou não me soube dizer se o homem da alma negra morreu porque se lhe secou a vida ou se foi porque abriu os olhos e lhe entrou o sol pela alma adentro.
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